A internet é uma boa forma de passar o tempo mas não é a única forma de passar a vida

28.12.06

Amigo!...



  Quando nasci já cá andavas. Pelos anos adiante fizeste parte do meu mundo. Brincámos de lutadores de luta livre na cama que fazia de ringue, Suados, deitávamos como se estivéssemos há muito a dormir quando ouvíamos uma chave a girar na porta de entrada.

  Fazíamos as nossas corridas de trotineta, de carros de rolamentos, jogávamos com a mesma bola. Quando foi necessária a tua presença tu estavas lá. Crescemos lado a lado e até pensavam que éramos gémeos.

  Andámos nos mesmos bailes, conhecemos as mesmas miúdas, passeávamos pelos mesmos locais. Histórias das nossas vidas e da tua contas agora com detalhes por mim desconhecidos.

  Fazia confusão a muita gente quando conversávamos, como se isso não fosse natural.

  Foste um guerreiro na mata, ali passaste algum tempo da tua vida. Segui pouco depois as tuas pisadas e mais uma vez os nossos trajectos foram iguais.

  Estávamos lá quando as balas assobiavam, as pessoas corriam, as pessoas tombavam.

  Estavas cá nos nascimentos, na perda de pessoas queridas, nos bons e maus momentos sempre juntos como se a nossa vida fosse uma vida paralela.

  E tem sido sempre assim… Ontem, hoje e sempre! …

  É bom saber que te tenho como um grande Amigo… meu Irmão!


Parabéns Mano  LeaoVerde


18.12.06

Há Mais Uma Estrela no Céu



Poema de Natal

                                  Para isso fomos feitos:
                                  Para lembrar e ser lembrados
                                  Para chorar e fazer chorar
                                  Para enterrar os nossos mortos —
                                  Por isso temos braços longos para os adeuses
                                  Mãos para colher o que foi dado
                                  Dedos para cavar a terra.
                                  Assim será nossa vida:
                                  Uma tarde sempre a esquecer
                                  Uma estrela a se apagar na treva
                                  Um caminho entre dois túmulos —
                                  Por isso precisamos velar
                                  Falar baixo, pisar leve, ver
                                  A noite dormir em silêncio.
                                  Não há muito o que dizer:
                                  Uma canção sobre um berço
                                  Um verso, talvez de amor
                                  Uma prece por quem se vai —
                                  Mas que essa hora não esqueça
                                  E por ela os nossos corações
                                  Se deixem, graves e simples.
                                  Pois para isso fomos feitos:
                                  Para a esperança no milagre
                                  Para a participação da poesia
                                  Para ver a face da morte —
                                  De repente nunca mais esperaremos...
                                  Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
                                  Nascemos, imensamente.

Vinicius de Moraes


Boas Festas e Feliz Ano Novo


15.8.06

Tocam os Sinos...



  Os sinos anunciam a saída da Procissão. Com os braços abertos, Nossa Senhora de Assunção, em frente ao porto de pesca, ao som das sereias e dos foguetes lançados das traineiras engalanadas, abençoa aqueles que no mar têm o seu ganha-pão, ou o seu leito de morte.


  Muitos anos atrás saía também a Procissão. No ar, um vagido se ouviu, mais alguém tinha nascido. Pelas cangostas andou. No antigo mercado saltou para juntar mais uma peça ao presépio; uma ovelhinha, o Menino Jesus, a Nª Senhora, o pastor... enquanto seu avô colocava mais um par de solas e, a sua companheira de uma vida, deambulava de aldeia em aldeia vendendo o que o mar dava.


  Com a sacola ao ombro e a sua lousa traçava, com pau de giz, as primeiras letras: B, A =BA.. Pela janela via o céu azul, o campo sem fim. A chuva, miudinha, caía durante semanas.

  De calção lá ia para a praia onde, feito miúdo Adão, se atirava enquanto na «Boca-do-Lobo» o mar fazia um barulho dos "diabos" e, todo o cuidado era pouco não fosse alguém ser engolido por aquela "garganta" escancarada.


  As traineiras ondulavam ao sabor das ondas e os barcos, na areia, aguardavam a chegada dos pescadores para mais uma ida ao mar. As mulheres olhavam para os seus "h'ómes" rezando com fé para que a faina corresse bem.
  "Ala-Arriba", gritavam as pescadeiras que, em conjunto com os homens, puxavam o barco com o pescado...


... que era logo ali dividido e comercializado na lota de pesca.


  Correrias, brincadeiras, ora com umas fisgadas bem “amandadas”, ora brincando de cowboys e de índios, uns jogos de bola junto à Fortaleza e, o polícia, mesmo ali a multar pois não se podia jogar descalço, no tempo em que uma sardinha alimentava quase uma família.


 O silvo de um barco atroou os ares, na amurada, as crianças viam o barco a desencostar do cais de embarque e a partir para o alto mar. No cais, lenços diziam adeus a quem partia...


 ... E, assim, se passaram horas, dias, anos!...

  Tocam os sinos, os foguetes estalejam... Vai sair a Procissão!

 Para a Poveira, minha mãe, um beijo do tamanho do mundo e desculpa ter-te feito "perder" a Festa da Assunção nesse ano!


A Poveirinha - Rancho Folclórico Poveiro


 Ala-Arriba! é uma expressão poveira que significa "força (para cima)".


15-08-2006

4.7.06

Do Alto da Falésia!...


 Podia pegar no tema que escrevi no ano passado e transcrevê-lo para aqui. Os momentos passados, vividos, sentidos têm todos os anos pontos comuns. Mas enquanto no ano passado voltaria para a Ilha,este ano voltaria para o algar ali na praia da Marinha (Carvoeiro) e, do alto da falésia, voltaria a desfrutar a imensidão do mar azul, as gaivotas que tão de perto passavam, o barquinho fundeado.

 Sentado, voltaria a sentir a brisa suave, o amor-próprio, o céu sereno, as vagas ondulantes, o murmúrio do canto das sereias. A meu lado um abismo, o algar de Leixões da Gaivota.

 Recordei os amigos da net que conheci pessoalmente, (Mário Lima-Amile o Luís Monteiro-Bufagato),o Marão que subi, as terras que visitei, as ruí­nas romanas que pisei, as pontes que atravessei, as grutas de Ibn Ammar que não encontrei. A estrada sinuosa do Pico da Fóia, a paisagem que lá do alto desfrutei.

 Os animais em vias de extinção que vi, como se de um safari se tratasse, as maravilhas em esculturas de areia, as ruí­nas dos conventos, dos castelos, do desprezo do homem para com a natureza, para com a cultura, para com a história.

 Sozinho, ali onde as minhas mãos "quase" tocavam o céu, senti-me pequenino mas também grande pois, nesse momento, comunguei com a Natureza e, no seu regaço me deitei, sonhando que num amanhã voltarei de novo... ao alto da falésia!


2006-07-04

10.4.06

Quinze anos de corridas...




  Parece que foi ontem mas já se passaram quinze anos que calcei os ténis e comecei a calcorrear as estradas. Ainda me lembro como comecei. Tendo em épocas idas treinado atletismo no S. L. B. de Luanda (só podia ser no Glorioso), pensei muitos anos depois, que tinha chegado a altura de enfiar de novo os ténis e ala que se faz tarde. Ingenuidade minha, tive uma “canelite” que me fez estar parado alguns meses. Mas a vontade era muita e rectificando os erros cometidos; como utilizar sapatos adequados e treinos progressivos eis, que num Domingo agreste fiz a minha primeira prova nos Bons – Dias ali para os lados de Caneças – Odivelas. Não foi mau mas com as subidas que tinha fiquei com a impressão que a partir daí as subidas passaram a ser o meu calcanhar de Aquiles. Digo eu, que já fiz tantas provas com subidas tão acentuadas, que escalar os Pirinéus deve ser uma brincadeira de crianças. Claro que é um exagero mas ao fim destes anos de corrida por certo já dava para subir e descer os Pirinéus várias vezes.

  Nestes anos, muitas lesões, muito desânimo, muito vento, granizo, chuva, e uma vontade enorme de dizer, BASTA!... Já chega. Mas, no Domingo seguinte, lá estou de novo à espera do tiro de partida para mais uma corrida, mais uma viagem.

  Uma vez em Cascais, chovia torrencialmente, cai depois granizo forte e feio, o pessoal foge, ora abrigando-se num quiosque ora para baixo das varandas do hotel, mas ao tiro da partida ali estávamos todos, arrepiados mas sem desfalecimentos, a caminho do Guincho com o vento impedindo-nos de correr mas com uma vontade indómita de chegar ao fim. E, quando ao fim de 20km, se avista a meta, o nosso peito abre-se numa alegria enorme pelo facto de que nem os obstáculos da Natureza nos impediu de realizar o sonho, o sonho de que, quando a gente quer, não há nada que nos impeça de o concretizar.

  Outra prova com tempo terrível foi em Espanha, Vigo/Baiona, meia-maratona, 21098m, ou seja 21km e uns trocos. 21km de sofrimento. Depois da meta “cortada” bem tentaram os massagistas colocar os músculos tensos pela prova em músculos tenrinhos mas nada. Acabaram por desistir e eu lá tive que arranjar forma de chegar ao transporte para regresso a Portugal.

  Já não tem conta a quantidade de provas que fiz; milhas (1609m), 5, 10, 15, 20, 21.098, 25km. Sei sim que fiz quatro maratonas (42195m, ou seja 42km) e chega.

  Nestes quinze anos de corrida conheci e conheço muita gente (alguns trapaceiros que infelizmente também os há nas corridas), todos os Domingos há aquela saudação, o reviver outras corridas e, após a prova, quando ainda estamos mal refeitos do esforço despendido pergunta-se: - Domingo aonde é que vais correr?... Isto só de malucos.

  A corrida na Ponte 25 de Abril é outro marco. No início era só meia ponte cortada ao trânsito, hoje é aquilo que toda a gente vê. Milhares de pessoas atravessam-na num misto de alegria e novidade pois nem sempre se avista a cidade de Lisboa da ponte… a pé!

  Uma saudação especial à Corrida dos Sinos em Mafra. Única prova até hoje que nunca faltei desde que comecei a correr. Tenho os sinos todos e a festa era linda quando os carrilhões do Convento tocavam à nossa passagem. Agora já não tocam mas a festa continua.

  Alguns companheiros de estrada já partiram, mas acredito que quando se ouve o trovejar, são passos desses meus companheiros a correrem nas estradas do céu.

E tu?... De que estás à espera?!... Vem correr, e traz outro amigo(a) também.


1.4.06

The Day After...

 Pois é, aqui estou eu, no dia seguinte, a conversar convosco sobre o dia anterior.

 Um ano se passou. Habituado aos fóruns foi um desafio tentar fazer num blog aquilo que habitualmente fazia lá. Textos sentidos, brincadeiras, e muita música. A vida, para mim, sem música não faz sentido. Ela acompanha o nosso estado de espírito, ora alegre, ora melancólico.

 Fazer um blog foi um desafio vencido. Olho para os meus três blogs e gosto daquilo que vejo e sinto um orgulho imenso em os ter feito. Personalizados, de temáticas diferentes, têm muito de mim, da paixão com que me entrego às coisas e o carinho que nelas coloco.

 Quero agradecer aqui os comentários já colocados, pessoas por quem nutro muito carinho, que vieram, como eu, dos fóruns e me incentivaram a fazer o que vocês vêem. Quero agradecer também a simpatia com que me receberam os que já por cá andavam.

 Sendo assim e, como disse anteriormente, para comemorar este meu 1º ano “vou-vos” dar música. Com a colocação do Rei Roberto Carlos dou por concluída a primeira fase daquilo que penso continuar a fazer. Faltava-me uma voz brasileira e ninguém melhor que o Rei para inaugurar a minha página musical, embora ela estivesse já há muito tempo no vosso canto esquerdo, lado que quase ninguém repara.

 Espero que tenham muitas horas de puro prazer ouvindo as músicas que lá coloquei. Para todos o meu Bem Hajam.

 Cliquem na imagem

24.2.06

Terry Fox




 Terry Fox (28 de julho de 1958 - 28 de junho de 1981) sofria de um cancro e, em consequência disso sofreu a amputação de uma perna.

  Para arrecadar fundos para pesquisas do tratamento do cancro, Terry resolveu efectuar uma travessia do Canadá a correr... não obstante ter uma perna artificial. Começou em 12 de Abril de 1980 a sua jornada em São João da Terra Nova, em Terra Nova e Labrador, na costa atlântica, e pretendia ir até Vancouver, Colúmbia Britânica, na costa pacífica, numa jornada que acabou conhecida como Marathon of Hope (Maratona da Esperança).

 Terry Fox correu durante a Marathon of Hope, em média, o equivalente a uma maratona - 42 quilómetros - por dia. Após 143 dias consecutivos, e de ter percorrido aproximadamente 5 300 quilómetros, Fox foi obrigado a parar, quando soube que o cancro se havia disseminado para os pulmões. Acabou por morrer alguns meses depois, aos 22 anos de idade.

 Terry foi proclamado como um herói nacional, tendo recebido várias honras nacionais. A Maratona da Esperança arrecadou donativos num valor total de 4,46 milhões de contos, está na moeda antiga para se ter a noção do valor alcançado, para pesquisa sobre o tratamento do cancro.

 Ao escrever aqui sobre Terry Fox, não é mais do que prestar uma homenagem a todos os deficientes que desta forma, ou de outra, lutam com dignidade, contra a adversidade da vida. Não ficam parados à espera que lhes resolvam o problema, vão à luta, mostrando que querer é poder. O mesmo querer que nos dá    Nuno Cabruja, a amiga   Bitu e o nosso campeão em cadeiras de rodas João Correia.


 Domingo lá estarei. Faça chuva, faça sol, caia granizo ou não, serei mais um entre milhares, entre eles os deficientes com cadeira de rodas, quem sabe se lá não estará o João, e outros deficientes (invisuais). Iremos calcorrear a estrada, numa corrida onde o mais importante é o de retirar prazer do intervalo que o nascer e o morrer nos dá. E, quando for em direcção ao Guincho, se as forças me faltarem, lembrar-me-ei do exemplo e da tenacidade que eles fazem para vencer os obstáculos no seu dia-a-dia, e a quem nem a deficiência lhes esmorece a vontade. Por certo, quando acabar os meus 20km, terei um sorriso nos lábios em homenagem a todos os Terry Fox’s do mundo.

Estátua de Terry Fox, em Ottawa


21.2.06

O Barbeiro...



  Fui hoje visitar-te. Já há muito que não ia até à tua barbearia. Estavas sentado, com a porta entreaberta pois o dia estava frio. Olhei para ti. Olhei para os teus cabelos brancos e já com os óculos bastante graduados. Há quanto tempo és tu que me cortas o cabelo?!... Ainda os meus rapazes eram umas crianças e já se sentavam na tábua de madeira para tu melhor poderes lhes cortar a trunfa. Agora, já homens feitos, não vão até ti. Outras mãos, que não as tuas, lhes aparam os gostos e os feitios que a moda dita.

 Eu parecia um Beatle. Um Beatle com as suas falhas mas o raio do cabelo aquecia-me as "zorelhas" e, como o tempo está frio era sempre prá amanhã!...

 Lembrei-me, quando menino e moço, ia a um casamento e logo nesse dia o “cota” mandou-me cortar o cabelo. Ora que chatice, logo nessa altura que ia fazer uma “banga” junto às miúdas é que ia cortar o meu cabelito. Ainda hoje sorrio quando me lembro de ter dito ao barbeiro: «Corte o cabelo mas de forma que só eu e você é que saibamos que ele foi cortado». Saí dali com o cabelo aparadinho mas compridinho e aí é que a porca torceu o rabo, como só eu e o barbeiro é que sabíamos que o cabelo tinha sido "cortado" foi o bom e o bonito com o “cota” pois ele não estava dentro do nosso plano e, se não fosse o facto de estar perto a hora do casório, lá teria que voltar de novo para a tosquia,... fui “salvo” pelo gongo.

 Lembrei-me depois daquela vez que fui a um cabeleireiro com todos os requintes, e umas mãos de mulher se colocaram sobre a minha cabeça. Quando me começou a falar de que diziam que as mulheres não sabiam fazer o corte do cabelo dos homens comecei a assustar-me. Já não olhava para o espelho e depois de paga a conta, antes de sair, olhei para todo o lado para ver se vinha alguém. É que o corte parecia mesmo do tipo Castelo Branco, só me faltava a malinha «Paco “Rabone”», comprada na feira de Carcavelos, a tiracolo, para parecer o dito cujo,... safa!...

 Ouvia o barulho característico da tesoura a cortar o cabelo. Ele, ia caindo também já com cores branquinhas na toalha. Estou a ficar como tu. Falei-te da festa na tua terra, a «Festa da Ascensão» e tu já a trocavas pela da Assunção.

 Olhei para o espelho, vi-te concentrado no teu trabalho. Calei-me pois as recordações de uma vida não se falam, escutam-se no silêncio de um olhar. Pegaste no pequeno espelho e eu disse que sim que estava tudo bem, mesmo que estivesse mal eu diria que sim, que estava tudo bem, pois tu fazes parte de um tempo que voa e, quando saí, encostando a porta disse: «Até há próxima, barbeiro do meu bairro».


P.S. - Cota na gíria significa o pai, a mãe ou outro adulto. Em África é o mais velho, o mais sábio da aldeia, o que aconselha, o que resolve as disputas. Em Portugal usa-se o termo de forma depreciativa. É pena.


6.2.06

Prosa do Quotidiano – 1




 Vi-te criança, suja, descalça, vergada sob o saco que nas costas levavas, caminhando trôpega na calçada. Quantos anos terias?! Pensei, 12,... 13,... talvez. No teu corpo franzino não é o tempo que te dá a idade, mas sim a tua vida de miséria.

 Sei que te vi num instante fugaz da paragem do autocarro onde seguia.

  O que levavas no saco?! Talvez papeis para os transformares em pão para os teus. Gente pobre e faminta na barraca onde existe mais um inquilino, a miséria.

 E tu criança, vencida pelo tempo, olhando para o chão como há procura de algo – ou seria do peso do fardo da vida?!

 Vi-te, e senti que, afinal, o sol, ainda não nasce igual para todos.



Lisboa, nov. 79

30.1.06

O Rei vai Nu...


                       P’lo jardim vai o rei passear
                       Levando pela mão a sua amada
                       Ouve-se a cachoeira murmurar
                       E o lindo chilrear da passarada

                       Viram estátuas, viram bancos
                       Viram lagos, viram fontes
                       Viram anjos, viram santos
                       Viram grifos aos montes

                       Neptuno com o seu tridente
                       Golfinhos em pedra tratada
                       Vai o rei p’lo terreiro sorridente
                       Abraçando a su'apaixonada

                       Cavalos treinados e galopados
                       Músculos tensos e trementes
                       No picadeiro são treinados
                       Por homens viris e competentes

                       Sai dali o rei satisfeito
                       Cheirando o cabelo de su'adorada
                       Param enlevados junto a um ribeiro
                       Que por baixo deles passava

                       Vai a mãozinha marota sem pejo
                       De encontro aos palpitantes seios
                       Arfa o peito aumenta o desejo
                       Unem as bocas em doces beijos

                       O local não é o mais indicado
                       Para sua realização plena
                       Olha o rei para todo o lado
                       Nessa manhã linda e amena

                       P’lo carreiro vai o rei
                       Por ervas e silvado adentro
                       Em prazeres destes não há lei
                       Só luxúria e amor no pensamento

                       Desaperta com frémito ardor
                       As calças caem duma assentada
                       Treme o corpo com vigor
                       Levanta a saia à sua amada

                       Estavam em puro deleito
                       Em frémitos ais de prazer
                       Corre o amor a preceito
                       Que lindo é de se ver

                       Mas de repente apareceu
                       Não se sabe d’onde surgiu
                       Em galope um grand'alazão

                       Saído da bruma como macaréu
                       Uma saia levantada ele viu
                       E um rei com as calças na mão.


Mário Lima
06.01.2005


Em fundo o Palácio de Queluz onde esta "estória", num dos seus jardins, bem podia ter acontecido.

O Palácio Nacional de Queluz é um palácio do século XVIII localizado na cidade de Queluz no concelho de Sintra, distrito de Lisboa. Um dos últimos grandes edifícios em estilo rococó erguidos na Europa.

Uma das rainhas que lá habitou foi Dona Carlota Joaquina, mulher do rei D. João VI.

É interessante ler a história desta rainha que casou, com o nosso futuro Rei, tinha ela 10 anos.

foto do Palácio e montagem: Mário Lima

2.1.06

A Veia Literária


 Pensava eu que, com o virar da página, as ideias caíam em catadupa dando-me a criatividade suficiente de temas tais que a capacidade de as ordenar seriam, no mínimo, impossíveis. Afinal a página virou e eu estou a olhar para uma página em branco. Que raiva, tanto tempo sem escrever e, da “caixa dos pirolitos” nada sai. Mas eu sei que tenho uma veia literária, não sei onde ela está mas sei que ela existe. Coloquei um garrote pois lembrei-me daquele ditado: «Mais vale uma mão inchada que uma enxada na mão», ora bolas, incharam-me as veias todas e não consegui nenhuma que sobressaísse.

 De veias falado nada mais me resta senão pedir ajuda. Sim, que posso mais fazer? Se não o fizer, passam-se os 90 dias e lá vem um aviso do sapo: «Ou arruma umas ideias ou o blog será eliminado». O tipo é chato, bem gostaria de saber se ele para além de ser um «mamarracho» também dá um prémio para a criatividade! É um unhas de fome é o que ele é.

 Assim vou colocar uma série de hipóteses de temas para que me possam ajudar. Para que tipo de escrita estou predestinado?


“Suspense”

 Ela olhou em todas as direcções. Não vê ninguém. Estava aflita. Se fosse homem resolveria mesmo ali o problema, mas não ela. Uma viela a seu lado direito era como um convite, mas seria que poderia estar à vontade ou naquele recanto estaria alguém que a pudesse ver?!... Ai os homens, a sorte que eles têm. Apertava as coxas uma contra a outra, estava lívida, não aguentava mais, o que fazer?...

 Aqui paro a narrativa, fica o “suspense” no ar: Conseguirá ela o objectivo?

Crime

 Crime - disse ela - quando viu o facalhão e o alguidar cheio de sangue (se não houver nada disto não há crime). A cozinha estava arrumada, tudo no seu devido lugar. Uma panela ao lume despertou-lhe a atenção. O que estaria ali dentro? Não se via vivalma. O silêncio era quase absoluto. De repente, ouve passos ligeiros, um calafrio percorre-lhe a espinha. Sempre ouvira dizer que o criminoso voltava sempre ao local do crime. Seria a vez dela? Tomou as precauções devidas, não sabia com que tipo de assassino estava a lidar, todo o cuidado era pouco e escondeu-se atrás da porta pronta a atacar quem lá viesse. A porta abre-se lentamente, o relógio de cuco cocou e, de repente!...

 O que terá acontecido naquela cozinha?


Sensual

 Pela primeira vez ele sente aqueles peitos. Roliços, enchem-lhe completamente as suas mãos. Sente a finura da sua pele. Os mamilos entumecem quando ele passa com os dedos. Um prazer enorme toca-lhe os sentidos quando aperta com delicadeza aqueles peitos volumosos, nunca tinha visto e sentido nada assim. Faria mesmo o que tinha a fazer sentado no banco onde estava. Podia fazê-lo de outra forma mas nada lhe daria mais prazer do que estar ali bem perto e sentir o cheiro do leite a jorrar para dentro do balde...

 O que estavam a pensar?...


Trágico

 Quando Romeu morre, fá-lo porque pensa que a sua amada Julieta se tinha matado por ele. Ó que tragédia! Ó que amor, Romeu morre pela sua amada. Sublime esta parte em que as lágrimas rolam pelas faces de quem assiste a esta dramática cena. As casadas abanam os leques pensando se o marido, a seu lado, faria o mesmo por ela. As solteiras, cheias de baba e ranho, soltam languidos suspiros, esperando que um dia, o seu Romeu lhes apareça em caminho, prontos a fazer o sacrifício supremo por elas... casando!

 Cena trágica; de um lado, Romeu esvaindo-se em sangue, do outro, Julieta deitada seminua. De repente, o choramingar do público presente para e um Ó de admiração percorre a plateia, Julieta soerga-se do seu leito e, olhando para o corpo lívido de Romeu exclama: - Que “ganda” parvo!

 Aqui, como narrador, terei que fazer uma pausa e saber quem foi que teve a ousadia de rescrever esta versão do Romeu e Julieta do grande SHAKESPEARE...

Cómico

 O neto bateu na avó. A população veio toda a terreiro tentando fazer justiça pelas próprias mãos. Onde é que se já viu isto? Um neto bater na avó?! Onde é que este mundo vai parar quando já não há respeito pelos mais velhos? E, pegando em foices, cajados e mais material de guerra, dirigem-se a casa da avó do neto a fim de julgar o criminoso. Lá longe, o primeiro-ministro desta aldeia, tem uma distensão muscular a descer os Alpes suíços, aqui são bem capazes de ter cãibras pois a ladeira é bem íngreme. A turba, chegando esbaforida, encontram a avó e o neto brincando à estátua, quem se mexe... leva!

 Nos Alpes suíços, o primeiro, coitado, com uma distensão muscular, recebe um único telegrama, do Seringueti, de um macaco que lá conheceu a desejar-lhe as melhoras,... povo ingrato!

 Agora a votação. É só clicar no tema que mais gostaram e, assim terei encontrado a minha veia literária e o meu futuro de escrita aqui no blog estará garantido.




Votação

Qual dos temas mais gostou?

“Suspense”

Crime

Sensual

Trágico

Cómico