A noite fora chuvosa. Sabia que o trânsito seria infernal quando saísse. E assim foi. Longas filas, acidentes vários. Dentro do carro a passo de caracol ia avançando e o sono apertando. Os olhos teimavam em fechar. Estava difícil aguentar o pára-arranca sem adormecer.
- Amanhã n'O Fio da Meada, será a vez da historiadora Irene Pimentel - assim falava António Macedo na Antena 1.
Condutores com a esperteza saloia que define muitos portugueses, iam na faixa contrária e tentavam meter-se um pouco mais à frente para recuperar dois lugares na já longa fila de quilómetros.
Olho para o céu. Dois deslumbrantes arco-íris tingiam o cinzento do corcel de nuvens que cavalgavam no espaço, ora abrindo clareiras por onde o sol espreitava, ora grossas bátegas caíam em força sobre os carros dos cada vez mais nervosos motoristas.
Dois arco-íris? Lindo. Um deles longe, outro bem perto. A estrada divide-se. Sigo para a direita, mas de tão lento que dava para ver tudo em pormenor. Uma menina ao volante no telemóvel escrevia. Outros fumavam desesperados. Ia deambulando o meu olhar até que o parei num determinado local, onde o verde na berma predominava. As cores do arco-íris terminavam (ou começavam) ali. As sete cores translúcidas mergulhavam naquele verde. Fiquei abismado, nunca tal tinha visto. Olhei maravilhado como se dali saísse o pote de ouro e um duende tomando conta dele contra a ganância do Homem.
Foram segundos, foi um instante pois logo de seguida cai em força nova remessa de água e as cores desvaneceram.
All in all it's just another brick in the wall
All in all you're just another brick in the wal
Cantavam os Pink Floyd no cd que tinha colocado. E o "muro" à minha frente não andava.
Duas horas e meia depois chego . "Home sweet home" - diz-me o tapete à entrada.
Olho pela vidraça do quarto. Um outro arco-íris brilhava intensamente. Mas não é o meu. Esse desfez-se nas brumas do tempo.
Fecho a persiana. Acomodo o corpo entre os lençóis e durmo o sono dos justos com um sorriso nos lábios. O meu arco-íris brilhava nele.
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